segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Singularidade ou o elogio da ignorância


Ainda que distemos algumas décadas até ao momento da singularidade, a inovação tecnológica e o acesso imediato à informação poderão estar já a provocar alterações na nossa forma de pensar. Sabemos que o raciocínio deve ser exercitado diariamente. Que o pensamento crítico se constrói. Que a sabedoria e o conhecimento não são coisas que se gravam numa pen. 

Hoje em dia, pouca gente lê. A queda na venda de livros demonstra isso mesmo e não parece que esta tenha sido substituída pelas leituras de livros online. O tempo dedicado anteriormente à leitura é hoje preenchido com horas a fazer scroll-down nas redes sociais. Contra mim falo. Esta estratégia de máquina de casino funciona comigo perfeitamente, de forma inconsciente, deslizando o dedo para baixo à espera que haja alguma informação do género jackpot. O que é raro, e os likes acabam distribuídos em memes e links para artigos fora da caixa. Hoje em dia, pouca gente lê, e julgo que nos jovens esta será uma fatura com um custo incalculável. Saberão os jovens hoje em dia quem foi Agamémnon ou Ifigénia? Que terrível segredo guardava Dorian Grey? Ou a história infame da família Buendía? Que catarse teremos hoje para oferecer às novas gerações, para que se tornem seres humanos melhores?  Terá sido tudo isto substituído por vídeos no Youtube e posts de influencers no Instagram? Espero que não.

Por outro lado, o acesso imediato à informação torna-nos progressivamente incapazes de debater ou refletir de forma crítica sobre determinado tema. Quando surge uma dúvida sobre alguma coisa num grupo, basta vê-los (e ver-me) a alcançar o telemóvel com a mão e rapidamente digitar a palavra em questão. Fica o assunto arrumado, não vale a pena estar a discutir sobre quem teria ou não razão. A reflexão crítica é um tema ainda mais sensível, principalmente se atentarmos à forma como partilhamos e disseminamos informação falsa disponível online. Será que basta que algo esteja escrito na internet, com uma linguagem e design minimamente cuidados, para que todos acreditemos que seja verdade? Aqui, a manipulação da opinião pública é uma autêntica caixa de Pandora, tudo é possível. 

Esta incapacidade de pensar e refletir progressiva tornar-se-á imesuravelmente mais perigosa, quando o momento da Singularidade chegar. Na possibilidade de não termos de procurar a informação porque a temos já incorporada no nosso cérebro. E na possibilidade dessa mesma informação ter sido manipulada logo à partida. Será que no final de contas, voltaremos todos para dentro da caverna, acreditando que tudo o que vemos projetado é a realidade?



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